Patrimônio Cultural no desgoverno Temer

O próprio Conselho Consultivo do Iphan, instância conformada por representantes da sociedade civil e de instituições públicas e privadas, manifestou-se em carta aberta dirigida ao presidente da república contra a criação desta secretaria.

Também o Instituto de Arquitetos do Brasil – IAB e a própria Associação de Servidores do IPHAN – ASPHAN manifestaram-se publicamente contra a criação da SEPHAN e a fragilização do IPHAN. Leia a íntegra da nota AQUI.

Como decorrência deste processo de luta de setores organizados da sociedade civil, foi possível reverter o golpe friamente arquitetado com o objetivo de fragilizar e, até mesmo, desestruturar definitivamente o IPHAN. Uma instituição que há 80 anos tem atuado de forma republicana, em defesa dos direitos culturais relacionados à memória e à afirmação de práticas e manifestações dos mais diversos grupos sociais que conformam a sociedade brasileira, por meio do reconhecimento e da preservação dos patrimônios culturais.

Nos últimos 13 anos, apesar das dificuldades relativas à manutenção de quadros devido à falta de um plano de carreira, estrutura de atuação e remuneração adequadas, o IPHAN conseguiu desenvolver iniciativas importantes para a efetiva modernização de soua gestão por meio do alinhamento ao Programa Nacional de Gestão Pública e Desburocratização – GESPÚBLICA (programa instituído pelo Decreto 5.378, de 23 de fevereiro de 2005). A título de exemplo, pode-se mencionar alguns avanços significativos como a publicação de sua Carta de Serviços e de um programa de implantação da gestão por processos com foco no resultado. Claro, que ainda se faz necessário forte esforço institucional para que haja continuidade neste projeto. Entretanto, desde a tomada do poder pelo governo golpista, as energias tanto de dirigentes comprometidos, aqueles que possuem histórico de atuação no campo da preservação patrimonial (vários ainda resistem nos respectivos cargos em Brasília e alguns nas superintendências estaduais), quanto de seus cerca de 700 servidores, ocupantes ou não de cargos de chefia, têm se voltado à defesa política da instituição e à manutenção dos avanços já conquistados na implementação de políticas públicas plurais e inclusivas de proteção e preservação dos patrimônios culturais frente à intensificação dos ataques contra a instituição e contra a forma republicana pela qual suas ações têm se pautado.

O caso Geddel Vieira Lima apenas escancarou para a sociedade o tipo de pressão que o IPHAN enfrenta cotidianamente no exercício da sua função. Especialmente, no caso dos licenciamentos ambientais, a atuação do órgão tem sido fortemente atacada pela mídia vinculada ao agronegócio como um “entrave” aos empreendimentos, ao desenvolvimento. Nessa esteira, a frente de ataque mais contundente vem do poder legislativo, como a proposição de regimes que “flexibilizariam” e, dessa forma, “tornariam mais agéis” os processos de licenciamento ambiental. A discussão desenvolvimento e preservação não é nova na área ambiental, muito menos no campo da cultura. Há pelo menos 30 anos o Brasil vem aperfeiçoando sua atuação neste campo e o retrocesso que ora se impõe está relacionado à notória falta de imparcialidade governamental no que se refere ao jogo de interesses entre grupos distintos que compõem a sociedade brasileira: empresários, citadinos, produtores rurais, povos e comunidades tradicionais, povos indígenas, comunidades quilombolas, entre outros. O que se têm, especialmente desde 2015, é um forte lobby do agronegócio dentro do Congresso Nacional resultando em projetos de lei que colocam em risco os direitos coletivos e difusos da sociedade brasileira no que diz respeito à preservação de patrimônios culturais no âmbito do licenciamento ambiental. Como afirmou o Coordenador Nacional de Licenciamento do IPHAN, em 13 de julho de 2016, após reunião sobre a temática no Ministério do Meio Ambiente – MMA:

“A PEC 65/2012 e o PLS 654/2015, que tramitam no Congresso Nacional, nos causam preocupação. Elas representam uma grave ameaça ao Patrimônio Cultural Brasileiro e a toda sociedade. Na prática, caso aprovadas, elas irão extinguir da sociedade e do poder público a possibilidade de avaliar a viabilidade dos empreendimentos frente às questões ambientais e culturais durante o processo de Licenciamento Ambiental. É preciso resgatar a concepção de que o Patrimônio Cultural não pode estar ausente das discussões que envolvem a Política Ambiental do País, afinal, são temas indissociáveis e, como tal, não podem ser tratados isoladamente”

Leia mais sobre o tema AQUI.

Posicionamento do Iphan em relação a PEC 65/2012

Posicionamento do Iphan em relação ao PLS 654/2015

É sabido que o ministro Calero, à revelia da direção do IPHAN, e como “bom moço” cumpridor de ordens, determinou a exoneração de superintendentes e a nomeação para os respectivos cargos de pessoas por indicação política. As trocas políticas têm afetado a atuação do órgão nos estados, mas o jogo está sendo jogado. Alguns servidores e especialistas apontam que a presidenta do IPHAN, servidora aposentada, tem demonstrado compromisso com a causa patrimonial, buscando assegurar as mínimas condições de funcionamento da autarquia e evitar o seu completo aparelhamento. Até o momento os cargos da direção nacional da autarquia não entraram no jogo, mas houve tentativa explícita de desmonte e subserviência aos poderosos como o caso da Superintendência do IPHAN-RJ, que por um feliz conjunto de fatores terminou malfadado, tendo os arquitetos dessa trama que se dobrar e aceitar o retorno da Superintendente (Leia denúncia sobre o caso // Manifestação do MPF-RJ // Notícia sobre o MinC voltando atrás). É preciso ter estômago. Cumpre ressaltar que tal interferência política na autonomia do IPHAN para escolha de seus dirigentes talvez somente tenha se dado durante o período da ditadura militar. A resistência do órgão aos impactos do golpe tem se dado pela vigilância da sociedade organizada e pela força de seu instrumental técnico e jurídico, que é o que pauta os atos administrativos engendrados pelo seu corpo técnico. Justamente por essa razão o forte empenho dos golpistas em fragilizar o órgão pela via do poder legislativo.