Incentivo Fiscal no Desgoverno Temer

O mais útil trabalho da CPI foi o espaço aberto para mais uma aula magistral do ex-ministro Juca Ferreira sobre o tema. Seguem alguns trechos da fala de Juca Ferreira na CPI:

“Mesmo que houvesse uma intenção de partidarização, quem decide quem recebe o recurso não tem esse vínculo”.

Como já explicitamos, quem decide pra onde vai o dinheiro são os departamentos de marketing das empresas privadas, que além de tudo ganham retorno de marketing com os projetos apoiados.

“Ninguém é maluco de tentar corromper um órgão que não tem poder de decisão. O certificado que os artistas ganham do Ministério da Cultura na Rouanet e nada, é a mesma coisa”

Circularam amplamente pela internet listas com os maiores captadores da Lei Rouanet. O ex-ministro nessa ocasião comentou que, por exemplo, o Itaú Cultural e a Rede Globo – por meio da Fundação Roberto Marinho – foram as duas grandes beneficiadas pela Lei.

“A gente está procurando ilegalidade, mas o dinheiro foi dado graciosamente. E foi legal. A lei permite”.

“Eu não sou jurista, mas tenho certeza que em última instância, a lei é inconstitucional”.

Em substituição à Lei Rouanet, Juca Ferreira defende uma nova iniciativa legislativa, feita pelo Ministério da Cultura e apresentada em março de 2016 ao senador Roberto Rocha (PSB-MA), relator do Projeto de Lei. Os ajustes feitos conferem maior clareza e segurança jurídica ao Procultura, e especialmente, correções às distorções atuais da Rouanet.

Enquanto isso, a gestão Temer-Calero publicou matérias dando destaque à reprovação de contas de diversos projetos da Lei Rouanet. A reprovação de parte ou todo de projetos faz parte da rotina da Secretaria de Fomento e Incentivo à Cultura – SEFIC, e não significa necessariamente fraude ou má-fé, podendo ser falta de conhecimento do proponente ou falhas formais de menor relevância. Ao gerar notícias dessa natureza, colaborou para uma chuva de pedras de uma opinião pública mal informada, que desconhece a forma de funcionamento do mecanismo que está criticando, e inegavelmente é uma ferramenta relevante de fomento à cultura. Choveram nas redes sociais argumentos nefastos e ignorantes tais como: “artistas vagabundos que mamam nas tetas do Estado”; “tinha mais é que ir trabalhar”. Efeitos colaterais graves de uma disputa política-midiática que em realidade usa qualquer tema possível para gerar desgaste, manchetes, memes e frases de efeito para demonizar ao máximo alguns partidos políticos, e assim favorecer a ilusão de que outros partidos são melhores, ou menos piores.

Queda livre no número de projetos apresentados em 2016

É difícil não associar o apedrejamento público desinformado do mecanismo de incentivo por renúncia fiscal, da Lei Rouanet e do Ministério da Cultura aos dados disponíveis na internet por meio do Sistema SalicNet.

Conforme dados da Tabela e gráficos abaixo, percebe-se em 2016 uma queda de 55% no número de projetos apresentados ao Ministério da Cultura para receber recursos de Incentivo Fiscal via Lei Rouanet. O patamar de 5094 projetos apresentados não era visto desde 1996, quando foram apresentados 3.773 projetos. Uma regressão de 20 anos.

A redução no número de projetos aprovados foi menor, mas ainda assim bastante significativa. Em 2016 o número caiu 18% em relação ao número de 2015, alcançando um patamar menor do que aquele de 2004. Uma regressão de 13 anos.

A redução no número de projetos que efetivamente captaram recursos foi ainda menor, mas também significativa. Em 2016 o número caiu 12% em relação ao número de 2015, alcançando um patamar menor do que aquele de 2006. Uma regressão de 10 anos.

Sem dúvida, os dados precisam ser melhor estudados, e compreendidas as suas razões, mas como não preocupar-se com o fato de que em 2016 chegamos a patamares de dez, treze, vinte anos atrás! Precisam ser considerados também fatores como inflação, e nesse sentido vale a pena a leitura de artigo publicado recentemente sobre o tema na versão virtual do periódico Políticas Culturais em Revista.

Observando o valor captado pelos projetos (Gráfico 2, abaixo) nota-se que de 2015 para 2016 houve uma queda de 7%, menor do que queda de 2014 para 2015 que havia sido de 10%. Vale lembrar que quando se trata de desempenho de captação de recursos não estamos falando da performance de gestão do Ministério da Cultura diretamente, já que depende da performance das entidades responsáveis pelos projetos culturais e das empresas que apoiam os projetos via renúncia fiscal.

Tabela 1 – Evolução anual do número de projetos culturais apresentados ao mecanismo de Incentivo Fiscal da Lei Rouanet

Ano

Qtde Apres.

Qtde  Aprov.

Qtde Apoio.

1993

19

10

2

1994

74

91

7

1995

1.378

69

153

1996

3.773

2.552

624

1997

7.535

3.011

1.299

1998

6.559

3.669

1.258

1999

8.281

3.346

1.221

2000

6.406

3.174

1.292

2001

8.393

2.840

1.540

2002

8.969

4.476

1.527

2003

7.163

4.222

1.543

2004

7.637

5.304

2.041

2005

12.553

6.739

2.476

2006

9.766

6.997

2.933

2007

11.972

6.876

3.236

2008

10.814

7.212

3.163

2009

9.185

5.078

3.042

2010

13.573

7.874

3.418

2011

14.066

7.787

3.752

2012

10.016

6.436

3.588

2013

11.556

6.463

3.481

2014

14.428

6.066

3.325

2015

11.275

5.459

3.151

2016

5.094

4.496

2.782

image1

Gráfico 1

image2

Gráfico 2

Fonte: Sistema SalicNet (Comparativo: Por ano)

Revisão da Regulamentação da Lei Rouanet

O Secretário da SEFIC na última gestão Juca Ferreira, Carlos Paiva, fez detalhada e sensata análise sobre o tema que tem sido um dos mais propagandeados como inovação da gestão Roberto Freire.

Carlos Paiva afirma que

“A revisão de Instrução Normativa é um processo natural de aperfeiçoamento da gestão, que já tinha sido iniciada durante a 2a gestão do ministro Juca Ferreira. Foram feitas reuniões com a Controladoria Geral da União (CGU), com servidores e com a CNIC entre o final de 2015 e início de 2016, precedidas de consulta pública pela internet com centenas de sugestões.

Muitos dos dados apresentados como novidade são, na verdade, uma consolidação de orientações que já estavam presentes nas súmulas da CNIC ou entendimentos que vinham se firmando no cotidiano da gestão. A incorporação destas normas na IN é inevitável e necessária. Neste aspecto, sua concretização é positiva, pois traz clareza e transparência às normas”.

Ele analisa a reforma ponto a ponto, destacando que alguns pontos são positivos, outros seriam positivos mas não foram feitos da maneira adequada, mas aponta que a nova Instrução Normativa também apresenta problemas relevantes.

“O que salta aos olhos, à primeira vista, é que as escolhas na IN e a forma como foi apresentada expressam uma visão que tem muita dificuldade em pensar fora do paradigma do incentivo fiscal. É uma ilusão pensar que o mecanismo é capaz de dar conta da diversidade da cultura brasileira, e um erro não enxergar sua natureza limitada, expressa nos dados históricos de concentração”.

Leia o post completo AQUI.